Uma das coisas mais interessantes que eu já presenciei é a diferença de percepção existente entre os desenvolvedores Java em geral e as pessoas da comunidade Linux. Nos últimos dois anos eu participei de vários eventos da tecnologia Java no Brasil. Dentre eles, os mais importantes com certeza foram os dois Sun Tech Days. Para aqueles que não conhecem, o Sun Tech Days é o maior evento de Java no Brasil. Ele é organizado pela Sun Microsystems Inc. e também acontece em outros países. Estes eventos seriam os segundos mais importantes depois do Java One, maior evento de Java do mundo que acontece anualmente em San Fracisco.
Nestes eventos sobre Java, é muito interessante a forma como a grande maioria dos desenvolvedores tem uma atitude de repúdio com o Windows, a tecnologia .NET e outras coisas vindas da Microsoft. Este tipo de comportamento é de certa forma normal em vários grupos de pessoas envolvidas com tecnologia. Até aí não vejo nada demais. A Microsoft mexe com o âmago de muitas pessoas, seja lá em qual sentido isto acontece. Obviamente, este tipo de comportamento é seguido pela defesa de tecnologias livres, aí incluindo, é claro, o sistema operacional Linux. Isto é ainda mais exacerbado pelo recente movimento da própria Sun na abertura do código-fonte de vários de seus produtos, inclusive o sistema operacional Solaris e da IDE de desenvolvimento NetBeans.
Neste ponto chego ao ponto interessante que comentei no inicio deste artigo. Ao mesmo tempo em que muitas pessoas envolvidas com Java no Brasil são a favor do software livre e do Linux, boa parte das pessoas da comunidade que eu já conheci não gostam da tecnologia Java. Existem, obviamente, vários motivos para este tipo de comportamento da pessoas da comunidade. Muitos não vêem com bons olhos as iniciativas de software livre da própria Sun devido às restrições das licenças da Sun. Especificamente em relação a Java, as licenças da maquina virtual Java e do SDK não são licenças de software livres. Os softwares são distribuídos gratuitamente e sua especificação é desenvolvida através do Java Community Process (JCP), que é um processo aberto a toda a comunidade para desenvolvimento das especificações de tecnologias relativas ao Java. No entanto, a implementação da Sun da máquina virtual Java e do seu SDK não possuem o código-fonte aberto, ainda.
Digo ainda porque existe uma certa boa vontade da Sun em liberalizar um pouco algumas questões relativas à licença do Java. Acho que ainda estamos um pouco longe de termos o código-fonte do Java SE da Sun liberados para a comunidade de software livre, mas no último Java One um dos principais assuntos foi a flexibilização da licença Java para que a implementação de Java SE da Sun possa, por exemplo, ser distribuída sem grandes problemas em distribuições Linux.
Apesar desta aparente boa vontade, posso estar enganado, mas as notícias mais recentes que tenho é que as distribuições Linux que antes estavam vendo com bons olhos a iniciativa da Sun para mudança da licença do Java agora estão com um pé atrás novamente. Isto porque as mudanças feitas na licença aparentemente não foram suficientes para que o Java possa ser disponibilizado juntamente com os outros pacotes de instalação das distribuições.
Esta questão legal, que é importante por um lado, acaba afetando diretamente os usuários finais que tem várias dificuldades para instalar o ambiente Java em Linux e utilizar este ambiente, por exemplo, dentro de seu navegador para acessar a um Internet Banking ou outra aplicação baseada em Java. Este tipo de dificuldade prática causada pelos problemas de licença acaba pesando muito na visão da comunidade de software livre sobre a tecnologia Java.
Não sei até que ponto este tipo de comportamento entre as pessoas envolvidas com a tecnologia Java e com a comunidade de software livre acontece em outras partes do mundo. No entanto, é interessante por si só verificar este tipo de relação no Brasil porque o Brasil é de longe o país com a maior comunidade de usuários Java do mundo e um dos mais ativos participantes em projetos de software livre também.